domingo, 19 de junho de 2011

Ergonomia: das múltiplas ferramentas para auxilio as tarefas cognitivas complexas

Ergonomia: das múltiplas ferramentas para auxilio as tarefas cognitivas complexas

Esse artigo foi publicado originalmente na Revista Engenharia de Produção e considerado pelos editores o melhor da revista em 2002.

NELCI BARROS, DR. ENG.
Universidade Federal de Santa Catarina
Professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – Centro Tecnológico CX. Postal 476 CEP.:88040900 Florianópolis Santa Catarina. E-Mail: nelci@newsite.com.br

MIGUEL FIOD NETO,DR. ENG.
Universidade Federal de Santa Catarina
Professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – Centro Tecnológico CX. Postal 476 CEP.:88040900 Florianópolis Santa Catarina. E-Mail: fiodneto@eps.ufsc.br




ABSTRACT:The article argues the problem of the methods inadequacy to assist the systems projects complex cognitive tasks of technology of the information. These methods are introduced by authors as Marmaras N. and Pavard B. (1999) among others, which introduce proposal of an approach guided to the problem recognizing the need to assist the complex cognitive tasks. Using of the metaphor of the Curve–S, learning curve, the article argues the need to if know the limit by the technological apprenticeship and the search, in other sciences, of substitutive technology, before the arrival to the limit in the Research and Development process, P&D. It indicates as priority to the multiple tools action from the conceptual project. Projection that in this isolated tools field are not enough for one assist complete. They are multiple necessary tools to be employed in each phase of the project.

WORDS-KEY: Ergonomics, Curve - S, Method.

RESUMO: O artigo discute o problema da inadequação de métodos para auxilio as tarefas cognitivas complexas de projetos de sistemas de tecnologia da informação. Esses métodos são apresentados por autores como Marmaras N. e Pavard B. (1999) entre outros, que introduzem proposta de uma abordagem orientada ao problema reconhecendo a necessidade de auxilio as tarefas cognitivas complexas. Utilizando-se da metáfora da Curva–S como curva de aprendizagem, o artigo discute a necessidade de se conhecer o limite imposto pelo estágio tecnológico e a procura, em outras ciências, de tecnologia substitutiva, antes da chegada ao limite no processo de Pesquisa e Desenvolvimento, P&D. Indica como prioridade à ação de múltiplas ferramentas a partir do projeto conceitual. Ressalta que nesse campo ferramentas isoladas não são suficientes para um auxilio completo. São necessárias múltiplas ferramentas para serem empregadas em cada fase do projeto.

PALAVRAS-CHAVE: Ergonomia, Curva - S, Método.



1. INTRODUÇÃO

Interessados no problema da inadequação de métodos para auxilio as tarefas cognitivas complexas de projetos de sistemas de tecnologia da informação autores como Marmaras N. e Pavard B. (1999) apresentaram proposta de uma abordagem orientada ao problema reconhecendo a necessidade de auxilio as tarefas cognitivas complexas. Essa abordagem é um passo que permite completar o método com uma ferramenta auxiliar de suporte às tarefas cognitivas complexas de projetos de sistemas de informação. Isso porque nenhuma ferramenta isolada pode dar conta do problema. Assim, com a finalidade de oferecer suporte a tarefas cognitivas complexas existem sistemas tecnológicos de informação com denominações e campos dos mais variados. Sua denominação é indicativa do tipo de suporte que oferecem.
Quadro – 1 Sistemas Tecnológicos de Informação
SISTEMA TECNOLÓGICO DE INFORMAÇÃO FINALIDADE
CAD Computer-aided design
CAM Computer aided manufacturing
DSS Decision support systems

Nesse caso, o tipo de suporte de cada sistema citado é conhecido pelos profissionais que utilizam nas mais diferentes situações de trabalho. Entretanto pode ser questionado, em que momento eles apresentam efetiva usabilidade? Podem ser citados como exemplo os sistemas CAD que não oferecem suporte as fases iniciais do projeto (fase do projeto conceitual e de criatividade). Considerando a observação de Lebehar (1986), o uso de sistemas CAD tem como requisito à introdução de imposições dimensionais (métricas). Nesse caso, o usuário tem que considerar essas imposições métricas desde o inicio do processo conceitual resultando em soluções menos adequadas que ampliam o tempo e o esforço de execução de projetos. Outros autores, como Hacker (1997), mostram no âmbito do projeto de engenharia em suas fases inicias do processo de projeto conceitual: (a) -Identificação dos objetivos; (b) - busca dos princípios para soluções de problemas, e relatam que essas fases não são auxiliadas pelos sistemas computacionais existentes.

2. Lacunas dos sistemas tecnológicos de apoio

São vários os motivos que podem contribuir para a inadequação dos sistemas tecnológicos de informação em relação ao suporte às tarefas cognitiva complexas na fase do projeto conceitual Barros e Fiod (2001). A maior parte desses sistemas tecnológicos de informação, quando de sua elaboração tiveram por base uma abordagem com foco na tecnologia, onde o projeto de sistemas é orientado pelos avanços da tecnologia da informação e por modelos teórico formais e técnico dentro da aplicação. Assim, essas ferramentas de apoio não têm como orientação às dificuldades encontradas pelos técnicos que resolvem problemas utilizando esses sistemas. Por outro lado, como chama atenção Marmaras N. e Pavard B. (1999), dentre outros autores, muitos desses sistemas foram desenvolvidos tendo por base o paradigma da prótese, cujo escopo principal é aplicar a tecnologia da computação para desenvolver máquinas especialistas autônomas (stand-alone/unique) que ofereçam alguma forma de resolução de problemas (Roth et al. 1987). Devem ser analisados ainda, os aspectos cognitivos dos especialistas humanos para os quais esses sistemas são dirigidos e considerados inadequados. Isso porque a semântica utilizada pelos especialistas num domínio e o modo pelo qual ele realmente resolve problemas complexos e toma decisões dentro dos limites e demandas colocadas pelo seu ambiente de trabalho são rejeitados (Marmaras et al. 1992, Roth et al. 1987). Pode ser acrescentado ainda, que modelos simplistas e teorias normativas, a maior parte desenvolvidas a parte de estudos realizados em situação de laboratório, são utilizados para o projeto de sistemas (Woods, 1992). Há que se considerar o aspecto de participação e colaboração de muitas situações reais e sua articulação com o trabalho individual hoje pouco considerado (Bannon, 1997). Por último, a questão do conhecimento tácito que são desenvolvidos pelos especialistas de um determinado domínio e dependem de demandas e das imposições do seu ambiente de trabalho, bem como de sua historia pedagógica e treinamento específico, (Nonaka e Takeuchi, (1985) não podem ser utilizados quando se usam esses sistemas, sob pena de resultar em ações errôneas. Também o ambiente, dentro do qual o trabalho é desenvolvido é considerado inadequado uma vez que se adota uma visão simplificadora do ambiente de trabalho, negando a importância dos elementos na sua complexidade. Trata-se da simplificação de sistemas complexos como, por exemplo, no domínio do controle de processos, onde muitos sistemas pressupõem componentes estáticos, com falhas únicas, o que revela uma extrema simplificação das situações de diagnostico, nas quais as pessoas que resolvem problemas lidam com possibilidade de falhas múltiplas, entendimentos errôneos de sinais e problemas de interação (Woods, 1992). Cabe, pois resolver como lidar com as dificuldades cognitivas encontradas pelos potenciais usuários na execução de tarefas complexas de resolução de problemas quando auxiliado por sistemas tecnológicos de informação. Dentro desse escopo, o que se discute diz respeito à necessidade de estabelecer uma ferramenta, segundo um modelo ergonômico genérico para análise de situações de trabalho para as quais o sistema tecnológico de informação foi proposto.

2. 1 A posição do produto no ciclo de desenvolvimento

A partir da idéia de realizar uma pesquisa para encontrar uma ou mais ferramentas ou mesmo um conjunto de técnicas para dar suporte ao pesquisador de produtos depara-se com
as seguintes questões:
a) o produto, foco da pesquisa, já existe e se deseja encontrar atributos inovadores;
b) o produto não existe, mas há soluções dadas por um conjunto de produtos que
oferecem solução para o problema; e
c) o produto não existe e se faz necessário que seja desenvolvido.

No primeiro caso, o produto está em qualquer dos pontos da Curva-S que representa seu ciclo de vida, sendo indiferente à localização de seu estágio de desenvolvimento. No segundo, um conjunto de produtos é associado para solução do problema, caracterizando uma convergência de tecnologias. No terceiro caso, o produto ainda não existe. À medida que a tecnologia evolui, descontinuidades ocorrem com freqüência. As empresas não conseguem prever ou gerenciar a descontinuidade, pois geralmente os produtos A e B apropriam-se de tecnologias diferentes oriundas do desenvolvimento de outras ciências possibilitando a criação de um produto que substituirá com vantagem adicional o produto existente. As transições tecnológicas, além de provocar o desaparecimento de produtos, resultam na exclusão produtiva de setores inteiros. À medida que a tecnologia evolui, descontinuidades ocorrem com freqüência. As empresas não conseguem prever ou gerenciar a descontinuidade, pois geralmente os produtos A e B apropriam-se de tecnologias diferentes oriundas do desenvolvimento de outras ciências possibilitando a criação de um produto que substituirá com vantagem adicional o produto existente.

As transições tecnológicas, além de provocar o desaparecimento de produtos, resultam na exclusão produtiva de setores inteiros. Essas transições não são percebidas no desenvolvimento do produto, particularmente quando apoiados por ferramenta auxiliar de suporte às tarefas cognitivas complexas de projetos de sistemas de informação


Figura – 1 Descontinuidades no desenvolvimento de produtos

Assim, os líderes da tecnologia atual raramente sobrevivem para se tornarem líderes da nova tecnologia. Uma descontinuidade pode permitir que o líder mantenha sua primeira posição no mercado, mas com uma participação reduzida.

Uma vez detectada a nova tecnologia que descontinuará o processo de obtenção do produto, é difícil deter o crescimento da velha tecnologia retirando-lhe recursos, quando está sendo apontado que progressos ainda podem ser realizados no ciclo do produto. Na década de 50, as válvulas a vácuo dominavam o mercado. O transistor havia conquistado uma fatia pequena desse mercado. A passagem da válvula a vácuo para o transistor caracteriza uma descontinuidade tecnológica. Primeiro, ocorreu à passagem da válvula a vácuo para o transistor. Essa transição teve implicações para o entrante com reação ao material a ser utilizado. O primeiro material empregado foi o germânio, usado pelos laboratórios Bell. Esse material chegou ao mercado por meio dos produtos da Hughes e Sylvania e acarretava uma alta taxa de rejeição, com conseqüente elevação dos custos.

Entretanto, a Texas Instruments e a Motorola apropriaram-se de outra tecnologia: a do silício, com uma faixa de lacuna de energia maior, mas com maior confiabilidade. O quadro a seguir mostra o que aconteceu de 1955 a 1982.
Quadro – 1 Entradas e saídas de empresas no período (1955-1982).

Na lista figuram as companhias produtoras de componentes eletrônicos, isto é, as que produzem para outros comprarem, não para uso próprio. O quadro mostra a entrada das empresas japonesas NEC, Fujitsu, Toshiba, Hitachi no início da década de 80 (Foster, 1986). Os quatro líderes de fabricação e venda de válvula a vácuo, National Vídeo, Rawland, Eimac e Landsdale Tube, não entraram no ramo de estado sólido e desapareceram diante do domínio da nova tecnologia. Outras empresas chegaram até 1960 fabricando válvulas a vácuo: Westinghouse (saiu desse mercado em 1960), Sylvania (vendeu seus ativos em 1965) e GE, que encerrou essa atividade em 1965. Veja-se como ocorreu a descontinuidade. As empresas que saíram do mercado, sem exceção, estavam pressas as questões de design no sentido de aperfeiçoamento tecnológico total do projeto e foram surpreendidas pela descontinuidade. Estavam orientadas para um problema. Mas o problema estava definido erroneamente. No exemplo, há quatro questões que emergem entre a continuidade e a descontinuidade:
a) não investir - decisão de não investir na nova tecnologia, com destaque para National Vídeo, Rawlan, Eimac e Lansdale, que saíram do mercado;
b) escolha equivocada - escolha da tecnologia errada na decisão de investir, atendendo
às pressões financeiras para encurtar o ciclo, citando-se as empresas: Hughes, Transitron e Clevite, que escolheram o germânio e por isso saíram de mercado;
c) demora - falta de rapidez na decisão de abandonar a tecnologia ultrapassada e apropriar a nova tecnologia em tempo, evidenciando-se a Westinghouse, Sylvania, GE, RCA e Philips, cuja demora não permitiu sustentação da posição de mercado;
d) definição errônea do problema.
Não basta saber que a Vigília Tecnológica aponta para a mudança e mostra a descontinuidade na apropriação da tecnologia. O novo aporte tecnológico necessita de mudança organizacional, precisa de flexibilidade para ruptura de expectativas anteriores e isso nem sempre é obtido. As pressões para se manter na curva e apenas encontrar um diferencial para o produto em relação ao do concorrente vêm de várias áreas da organização. A teoria financeira convencional não tem um modo prático de levar em conta o custo oportunidade de investir na nova tecnologia.

2. O treinamento centrado em questões de continuidade


O treinamento acadêmico tradicional é centrado nas questões da continuidade. Do ponto de vista específico da razão clássica, uma contradição torna absurdo o pensamento onde se inscreve. Uma descontinuidade deixa os pesquisadores atônitos. A contradição que interessa colocar em foco não é a que aparece num raciocínio incoerente ou proveniente da ausência de racionalidade, mas que surge do pensamento racional, aquela contradição que “aparece ao termo de uma dedução correta a partir de premissas consistentes” (Waltzlawick, 1978, p. 188). Os físicos do início do século, em pesquisas da microfísica quântica, se depararam com esse tipo de contradição. Essa contradição, inicialmente, afetou os próprios fundamentos da realidade empírica e da coerência lógica, quando se verifica que, segundo as condições experimentais, a partícula comporta-se ora como onda, ora como corpúsculo. Um exemplo, foi dado por Heisemberg e trouxe um pouco de luz para a contradição encontrada colocando: “em teoria quântica, uma alternativa não pede necessariamente as respostas sim ou não, pois há outras respostas” (Heisemberg, 1962, p. 320). O impasse existente só encontrou solução quando Niels Bohr compreendeu que a contradição entre os termos complementares onda e corpúsculo era apenas uma das contradições ou antinomias do mesmo tipo já encontrado em outros lugares, mas desconsideradas em benefício de um dos dois termos opostos: (I) contínuo/descontínuo; (II) espécie/indivíduo; (III) sociedade/indivíduo. A partir de Bohr, uma nova antinomia surgiu, saída da própria física quântica; coisas separadas/realidade inseparável (Whitehead, 1978). O próprio Whitehead acrescenta: na lógica formal, uma contradição é indício de uma derrota, mas, na evolução do saber, marca o primeiro passo do progresso rumo à vitória (Whitehead, 1978).
Não se trata somente de associar duas verdades contrárias para ter acesso a uma verdade mais profunda ou mais completa. Trata-se de observar que a verdade pode encontrar-se no vácuo, insondável, na brecha lógica aberta por uma contradição, por uma descontinuidade.
Para Morin (1985), a contradição pode apresentar-se como atentado ao bom senso (paradoxo), como conflito entre duas proposições igualmente demonstráveis (antinomias), como confronto entre duas soluções incompatíveis entre si (aporias) e, mais amplamente, como acasalamento de dois termos que se excluem reciprocamente.
Assim, a emergência da indeterminação quântica, do princípio de incerteza de Heisemberg, e o reconhecimento de uma contradição insuperável na noção de partícula minam, ao mesmo tempo, a idéia de determinismo mecânico e os princípios de identidade, de contradição e de terceiro excluído da matemática.
Por último, ter em mente que o uso da lógica é necessário à inteligibilidade, e a ultrapassagem da lógica faz parte do problema para a compreensão completa do quadro. A lógica está a serviço da observação, da experiência, da imaginação. Ela prolonga a idéia nova nas suas conseqüências, contudo não a suscita. A prospecção tecnológica procura o novo, não procura o lógico. Antes da ferramenta voltada para o problema, é preciso questionar o problema. Está definido adequadamente ou foi apenas dado continuidade aos estudos e pesquisas anteriores? As anomalias foram estudadas ou abandonadas porque não são partes do problema?


3.1 As anomalias encontradas em pesquisa

Nada está definitivamente descoberto e aperfeiçoado, o mundo está no devir permanente do fazer. A descontinuidade não é confortável, pois obriga a se permanecer alerta, pesquisando, analisando, estudando. O que é pior para quem acredita em caminhos mágicos e de trânsito fácil é que grande parte dos cientistas tem chegado a descobertas e conclusões ao perceber anomalias do descontínuo. Nesse caso, esses cientistas são obrigados a abandonar sua pesquisa básica, pois uma anomalia se interpõe em seu caminho, desviando o curso de seus passos metodológicos em direção a uma descoberta longe da continuidade em estudo.
Muitas invenções foram obra do acaso ou do exame de uma possível anomalia. Mas será que nessa rede complexa de elementos simples evolui o espírito do pesquisador ao acaso? Como se atualiza essa rede potencial cujos elementos se pretende examinar? Não há realmente qualquer objetivo, qualquer guia, qualquer orientação nessas redes ramificadas? Quais são, em suma, os progressos de utilização dessas redes? Essas questões precisam ser analisadas para que se compreenda o papel da Vigília Tecnológica no âmbito das ciências antes de se preocupar com as modificações do produto no chão da fábrica. O pesquisador está sujeito às mesmas condições do homem comum no que diz respeito às suas crenças, visão de mundo, habitus e às condicionantes sociais. Para Moles (1971, p. 208), “Não há, pelo menos na origem, transcendência do pesquisador com respeito ao comum dos homens; um é recrutado entre os outros e seus processos intelectuais elementares são tirados do fundo comum do pensamento: o racionalismo formal só intervém no estágio último e aperfeiçoado da pesquisa científica”.

3.2 Metáforas e manuais: entre o abstrato e o concreto

Toda cadeia conceitual precisa se traduzir por uma constatação ou uma experiência. O problema da realização impõe restrições ao desenvolvimento desta última que podem diferenciar de modo pragmático imaginação e invenção.

Para Moles (1971, p.215), um dos primeiros estágios da criação é quase sempre a imaginação: “esta tendência que todos nós temos, a propósito de um dado problema, a construir em nosso espírito um projeto mais ou menos realizável, a aperfeiçoá-lo, a enriquecê-lo, a flori-lo com experiências mais ou menos complicadas etc.”.

Trata-se de uma tendência que todos os pesquisadores possuem em grau qualquer: “secretar idéias, fabricar teorias, projetar aparelhos, imaginar verificações” (Moles, 1971, p. 215). É nesse instante criativo que o pesquisador vai à busca de seus manuais, livros didáticos, anotações, artigos, anais de congressos, comunicações científicas, para a primeira verificação de ordem puramente pessoal em busca de resposta para perguntas do tipo: será isso possível? Não estou contrariando alguma lei conhecida? Já fizeram isso? Por que ainda não encontraram essa resposta para o problema? Obras de ficção científica, por certo, não serão cogitadas. São documentos apócrifos para o cientista. Nesse instante o paradigma cria evidências, auto-ocultando-se. Como está invisível, quem está submetido a ele pensa obedecer aos fatos, à experiência, à lógica. Morin, (1985) chama a atenção do pesquisador para a armadilha paradigmática: um paradigma é co-gerador do sentimento de realidade, pois o enquadramento conceitual e lógico do que é percebido como real deriva da determinação paradigmática. Assim, quem obedece ao paradigma da Ordem Soberana crê que todos os fenômenos deterministas são fatos reais, enquanto os fenômenos aleatórios seriam apenas aparências (Morin, 1985).

Nesse caso, a ciência está aqui entendida como: conhecimento que inclua, em qualquer forma ou medida, uma garantia da própria validade. A limitação expressa pelas palavras “em qualquer forma ou medida” é aqui incluída para tornar a definição aplicável à ciência contemporânea, que não tem pretensões de absoluto (Abbagnano, 1998). Segundo o conceito tradicional, a ciência inclui garantia absoluta de validade, sendo, portanto, como conhecimento, o grau máximo da certeza. O oposto da ciência é a opinião caracterizada pela falta de garantia acerca de sua validade. As diferentes concepções de ciência podem ser distinguidas conforme a garantia de validade que se lhes atribui. Essa garantia pode consistir, primeiro, na demonstração; segundo, na descrição; e, terceiro, na correção.

4. Processos de mútua causalidade

Não existe uma teoria completa ou ferramenta que esgote o assunto. O grande número de parâmetros presentes, as condições de entorno que variam de um momento para outro, a incerteza e a forte carga de subjetividade nas decisões sobre que tecnologia adotar e sobre que ciência buscar como suporte para apropriar tecnologia, tornam impossível um modelo de prospecção completo, capaz de esgotar o assunto. Nos últimos anos vem aparecendo na literatura especializada um esforço para assentar as bases para explicações sobre o desenvolvimento tecnológico. Sua raiz se encontra na Teoria da Complexidade, em que, do mesmo modo que em processos físicos, é impossível saber qual vai ser o estágio final de um sistema capaz de verificar condições subjetivas em um ambiente de incerteza e de aspectos intangíveis.

O tipo de análise proposto tem por finalidade raciocinar sobre o problema, revelando o modelo de relações que arrebatam o desenvolvimento do produto das malhas da tecnologia e da ciência que lhe dão suporte para continuidade. Uma rede de feedback positivo e negativo forma o conjunto de relações. O feedback positivo ganha maior destaque à medida que as relações vão configurando a saída para a descontinuidade. A maior parte das técnicas para esse tipo de prospecção cai na armadilha do pensamento “linear”, em busca de causas simples que se acredita estar na raiz do problema. Esse raciocínio linear acaba por estabelecer as bases para soluções lineares. A teoria da autopoiesis (Maturana, 1997) trouxe uma nova compreensão quanto a mudanças por meio de padrões circulares de interação. A teoria encoraja a que se pense sobre a mudança como círculos e não linhas. A teoria dá suporte para substituir a idéia de causalidade, que sugere que A é causa de B, que é substituída pela idéia de mútua causalidade, que sugere que A e B podem definir-se um ao outro como conseqüência de pertencerem ao mesmo sistema de relações circulares como ilustra figura 2.

Figura – 2 Relações que contribuem para a continuidade

O desenho da figura 2 apresenta uma análise contextual de algumas das inúmeras relações que contribuem para sair da continuidade do desenvolvimento do produto, para apropriar tecnologia disponível em outra área do conhecimento científico. Já foi visto que ao se colocar em evidência a questão da descontinuidade no desenvolvimento do produto, tem-se na continuidade o raciocínio linear e na passagem para a descontinuidade o raciocínio da circularidade, que envolvem as variáveis, estabelecendo relações de mútua causalidade. Magorah Maruyama (1963) focaliza o papel do feedback positivo e negativo no estudo da dinâmica dos sistemas. Maruyama mostra a importância de processos de feedback negativo, em que uma mudança em uma variável inicia uma mudança na direção oposta para explicar a estabilidade de sistemas. Processos são caracterizados por feedback positivo, segundo os quais “mais leva a mais” e “menos, a menos”. Esses conceitos são importantes para a explicação de mudanças em sistemas. As relações ilustradas na rede estabelecem a causalidade mútua existente entre as variáveis. As intervenções têm grande possibilidade de repercutir por meio do todo. Desse modo, é necessário ajustar as intervenções para obter o tipo de transformação sistêmica desejada.

5. CONCLUSÕES

A proposta de Marmaras N. e Pavard B. (1999) de abordagem orientada ao problema reconhece a necessidade de auxilio as tarefas cognitivas complexas. O problema para correção de inadequações das ferramentas de apoio não fica resolvido, uma vez que o método proposto não tenha inicio nos tramites do projeto conceitual. Qualquer ferramenta, só possibilita apoio se utilizada na fase dita de “criatividade”. Nesse caso, ser orientada para o problema é um primeiro passo para geração de novas ferramentas de suporte às tarefas cognitivas complexas de projetos de sistemas de informação. Entretanto, ressalta-se que nesse campo ferramentas isoladas não são suficientes para um auxilio completo. São necessárias múltiplas ferramentas para serem empregadas em cada fase do projeto. Dentro desse escopo, citam-se trabalhos a partir da associação da Theory of Inventive Problem Solving (TIPS) e Método DELPHI como ferramentas múltiplas no desenvolvimento do produto (Barros e Fiod, 20001) acrescentando-se que inúmeros outros autores que se interessam pelo assunto vêm publicado propostas de emprego de ferramentas conjugadas para suporte no desenvolvimento do produto. Para os interessados vale seguir a trilha.

6. Referencias Bibliográficas


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